10 novembro 2009

O adeus da menina que sonhava ser professora

O relógio marcava 21h35min quando um estranho bateu à porta da industriária Luana Figueira, 24 anos.
– A senhora é a mãe de duas meninas?
– Sim – respondeu uma já temerosa Luana.
Antes do diálogo prosseguir, Luana, tomada pelos piores presságios, questionou-se: – O que aconteceu com as gurias?
Cerca de uma hora antes, no sábado, Luana havia pedido para as filhas Janine Tainá Figueira de Souza, oito anos, e Larissa Kailane Figueira de Souza, seis anos, irem a um minimercado distante 1,2 quilômetro da residência de dois cômodos da família, no bairro Industrial Sul, em Campo Bom.
– Elas foram atropeladas. Acho que uma está morta – continuou o desconhecido.
Com uma sacola plástica carregada com massa, creme de leite, guisado, tomate, cenoura e cebola, que se transformariam num jantar em família, Larissa e Janine retornavam do minimercado Rosa. Sem calçada, caminhavam pelo acostamento da Avenida dos Municípios quando um Kadett as surpreendeu. Larissa, mais próxima da via, conseguiu empurrar a irmã para fora da pista antes de ser atingida.
– Ela salvou a minha vida – conta Janine, que recupera-se de duas fraturas no braço esquerdo.
Sem deixar marcas de freada, o Kadett que atropelou Larissa fugiu sem prestar socorro. Ao deparar com a filha de bruços no chão, Luana desesperou-se:
– Quando a segurei pelos braços, os ombros vieram juntos. O corpo, não.
Segundo o atestado de óbito, “traumatismo crânio-encefálico” vitimou a menina.
Aos seis anos, Larissa sonhava ser professora e lutava para manter-se no mesmo nível dos colegas da turma 11A da Escola Municipal Presidente Vargas. Com idade para frequentar creches, pulou etapas.
– Como nunca consegui vaga numa creche pública, matriculei ela no colégio. Precisa fazer reforço, mas estava sendo alfabetizada – conta Luana.
Em casa, a irmã, Janine, paparicava Larissa.
– Ela sempre entrava no banho e gritava: “esqueci a toalha”. E a gente levava a toalha – recorda.
Desde a noite de sábado, Larissa, sepultada num ataúde branco na gaveta 859 do Cemitério Municipal, reapareceu uma vez para Janine. No sonho, ela aparecia em forma de anjo da guarda e disse que estava tudo bem.
Ontem, partes do espelho retrovisor e dois dígitos da placa memorizados por uma testemunha levaram a Polícia Civil a descobrir o paradeiro do veículo. Os policiais acreditam ter chegado ao principal suspeito do crime, um microempresário calçadista, morador próximo do local do acidente. O suspeito é aguardado hoje na delegacia.