26 janeiro 2011

O lugar onde pulsa o coração do sertanejo

Brasil de Bombachas
Durante a cruzada pelo sertão de Goiás, na cidade de Jussara, em um corredor à beira da estrada, encontramos a alma do sertanejo: a comitiva. Um grupo de peões que conduz a tropa de gado por longas distância à moda antiga. A lida diária deles é a fonte de inspiração para as músicas sertanejas. Como a do tropeiro do pampa é para a cultura gaúcha.
A comitiva que encontramos é de Augusto Ferreira da Silva — conhecido como Capim Gordura — um homem de 52 anos, que já perdeu as contas de quanto tempo faz que conduz tropas pelos sertões de Goiás. Ele, Itamar Alves e Miranda, 61, o Playboy; Oscar Pereira do Carmo, 48, o Índio; Fernando Manoel Ferreira dos Santos, 25, o Sanrisal; e Dileno Pereira Fagundes, 23, o Gaúcho; estão há 20 dias conduzindo uma tropa de 400 cabeças de gado.
Brasil de Bombachas
Capim Gordura acredita que deverão chegar em dez dias ao seu destino: uma fazenda onde o gado deverá ficar engordando durante um ano. Ele não é de muito conversa. O mais falante é o Playboy, um típico vaqueiro de Goiás. Enquanto terminava os preparativos do acampamento, montado perto da tropa que descansava, ele perguntou:
— Mas quem são vocês?
Respondi:
— Somos repórteres da Zero Hora, jornal lá do Rio Grande do Sul.
Logo a seguir, sob os olhares atentos do grupo de vaqueiros, eu expliquei que, há 15 anos, havia passado por ali escrevendo a história dos gaúchos que povoaram vários sertões ao norte do Rio Uruguai. É o Brasil de Bombachas, eu disse.
O Playboy abriu um grande sorriso e apontou o dedo em direção a um dos seus companheiros, falando:
— Temos um gaúcho aqui: é o graxeiro.
O graxeiro é o cozinheiro da comitiva, posto importante, tanto que ganha R$ 40,00 por dia, enquanto os outros ganham R$ 30,00. O Fagundes, a quem todos chamam de Gaúcho, é um grande conhecedor dos gostos culinários dos vaqueiros. Perguntei se ele era gaúcho.
— Olha, seu moço, eu sou vaqueiro do Pantanal do Mato Grosso. Quando vim trabalhar em Goiás, fui chamado de gaúcho, mas não sou. Acho que é porque uso algumas vestes e palavras parecidas com as dos vizinhos pantaneiros castelhanos, que são muito semelhantes às dos gaúchos.
Brasil de Bombachas
Enquanto conversávamos, a poucos metros do acampamento, na rodovia, o grande inimigo da comitiva de vaqueiros passava: o caminhão boiadeiro, veículo preferido pelos fazendeiros para levar as suas tropas. Na opinião do Gaúcho, o cantinho do vaqueiro no transporte do gado vai existir sempre. Ele diz o seguinte:
— Há lugares no sertão que os caminhões não conseguem andar. E também sempre existirá o dono da boiada comprometido com o nosso modo de vida.
Ao anoitecer, termimos a conversa, pois, nesse horário, o gado fica muito sensível e qualquer ruído pode estourar a boiada.