28 maio 2013

Senador boliviano completa um ano refugiado na embaixada brasileira em La Paz

Roger Pinto vive em pequena peça da representação
brasileira, onde recebeu a filha ao completar 53 anos
Foto: Arquivo pessoal / Arquivo pessoal
Com o sentimento de reclusão, recebendo poucas visitas e tendo de tomar vitaminas para compensar a falta de sol, o senador boliviano Roger Pinto completa nesta terça-feira um ano refugiado na embaixada do Brasil em La Paz.

Pinto tinha a expectativa de que ocorreria, também nesta terça, a apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, no Brasil, de ação em que pede "habeas corpus extraterritorial". A análise, porém, foi adiada, talvez para o dia 5.

– Esperávamos que terça o Supremo apreciasse o caso. Mas o ministro Marco Aurélio Mello pediu informações à presidência, e as informações não chegaram. Teremos de
esperar até a próxima quarta-feira – diz o advogado Fernando Tibúrcio.

Sem a apreciação do caso pelo STF, em La Paz estava sendo preparado para hoje um ato pelo "aniversário". Políticos de oposição ao governo de Evo Morales e Denise, filha de Pinto, de 23 anos, falarão ao público.

Pinto, 53 anos, conversou com Zero Hora pelo telefone ontem, mas se disse impedido de dar entrevistas. Ele é um dos líderes da oposição a Evo e se define como perseguido político. Motivo de tal suposta perseguição: denunciou autoridades bolivianas por corrupção e narcotráfico.

O governo boliviano, por outro lado, nega-se a lhe dar salvo-conduto para deixar o país, sob a justificativa de que Pinto responde a uma série de processos judiciais. O Itamaraty evita se pronunciar, alegando que manifestações podem ser prejudiciais às negociações diplomáticas. Desde março, uma comissão bilateral discute a questão. Houve duas reuniões, em 1º de abril, em São Paulo, e no início de maio, em Cochabamba.

Enquanto as discussões ocorrem, Pinto tem de se manter no espaço de 20 m² a que está restrito e isolado no primeiro andar da embaixada, com um janelão por onde dá olhadas furtivas a uma praça no centro de La Paz, acompanhando notícias em um tablet, vendo televisão, lendo seis livros acomodados ao lado de sua cama (entre eles, uma biografia de Winston Churchill) e se exercitando em uma bicicleta ergométrica.

Pinto se ressente das limitações às visitas: apenas Denise, uma prima, um assessor e um advogado podem vê-lo. O pastor que o visitava (ele é evangélico) não pode mais fazê-lo.

Caso Pinto seja beneficiado com o habeas, é provável que viva em Brasileia (no Acre, a uma ponte da boliviana Cobija), onde estão a mulher, outra filha, dois netos e a sogra de 95 anos. Um dos momentos mais melancólicos vividos nesse período foi seu aniversário, em 23 de abril. A comemoração teve a presença de Denise e a participação remota dos outros integrantes da família, por Skype.

O desconforto entre Brasil e Bolívia

Roger Pinto, pecuarista e pastor batista, é senador desde 2006. Em 25 de maio do ano passado, disse ter descoberto um plano para matá-lo. Reclamou para o governo de Evo Morales. O governo não reagiu. A alternativa: pedir asilo ao Brasil. Afinal, Pinto vem do departamento de Pando, divisa com o Acre. Ao lhe dar asilo, o Brasil acatou a alegação de que Pinto é perseguido e corre risco de vida. Quando chegou à embaixada, ele levou um dossiê com suas principais acusações.

É uma saia justa. Evo sustenta que Pinto é um "delinquente" (até de homicídio o acusa) – definição usual para seus adversários. Recusa-se a dar salvo-conduto para o senador. No ano passado, chegou a haver um desconforto: o vice boliviano, Álvaro Linera, classificou a atuação brasileira como "insensata". Brasil e Bolívia são aliados em blocos regionais. A solução é delicada e talvez venha a ser resolvida quando o STF, apartado das questões políticas, decidir tecnicamente o que fazer com Pinto.